Donnerstag, April 06, 2006

SOLIDÃO

Marcelo gesticulava na televisão.
O café estava cheio e ninguém, aparentemente, está a ouvir o professor.
É domingo, portanto, passam já uns bons minutos das nove da noite.
A meu lado, um homem mastiga solenemente uma bifana.
Junto a si, um copo de cerveja também meio adormecido, um jornal desportivo ainda dobrado a meio e um telemóvel de modelo antigo.
O homem olha em volta.
De repente, pega no telefone, tecla alguns números, espera uns instantes e encosta-o ao ouvido dizendo: Olá boa noite…!
Olhei para outro lado, reparei noutras mesas, tentei perceber os comentários do professor Marcelo, na RTP1, através do movimento dos seus lábios, espreitei a agitação dos funcionários no balcão e regressei ao homem da bifana.
Uns minutos depois, continuava a mastigar lentamente, a sandes com um pedaço de bife e a falar ao telefone.
A conversa era parca em palavras.
Ele ia assentindo com a cabeça e monologava “sins” e “huns” e pouco mais.
Falava e olhava á volta.
Ás vezes, reparava em mim, que era o cliente mais próximo, e quando nos cruzávamos o olhar tornava-se mais expansivo, gesticulava, dizia “hun, hun, pois, pois, estou a compreender” e coisas assim.
E sorria-me, como se eu entendesse a conversa.
Desligou o telemóvel ao fim de quase dez minutos.
Ergueu a mão, e pediu a conta,
Pagou e saiu, dando boas noites em voz alta a qual só eu respondi.
Algum tempo depois, o empregado aproxima-se da sua mesa, limpa as migalhas de pão, as gotas de cerveja e já quase ia embora quando se vira para mim e diz: “Reparou no velhote que aqui esteve?”
Disse que sim e ele acrescenta: “ Sabe? Coitado, vive sozinho e janta sempre a mesma coisa.
Uma bifana e uma cerveja.
Ás vezes pede sopa e um croquete.
Vive sozinho, não tem ninguém.
Não sei se reparou, ele estava para ali a falar ao telefone.
É sempre a mesma coisa.
Ninguém lhe liga.
Aquilo é tudo a fingir.”
De repente, recordei o olhar dele e percebi como era amargo.
A solidão é mesmo uma armadilha.

6 Kommentare:

Maria hat gesagt…

A solidão numa das suas faces...
Gostei de te ler. Bigada pela visita. Beijos.

Concha Pelayo/ AICA (de la Asociación Internacional de Críticos de Arte) hat gesagt…

Pasear por tu blog también es aprender que la vida siempre nos da y nos quita. Me ha gustado mucho tu forma de escribir. Un saludo.

Jorge hat gesagt…

Seja bem aparecido meu amigo.
Bela estória e muito bem contada.
Um abraço amigo. Quando é que aparece'
Temos saudades suas.
Depois de domingo volto a Lisboa. diga qualquer coisa.
Um abraço.

Concha Pelayo/ AICA (de la Asociación Internacional de Críticos de Arte) hat gesagt…

Hola amigo. No, no soy ninguna profesional de la fotografía. Me gusta fotografiarlo todo, pero sin técnica ninguna. Saludos.

Carlos de Matos hat gesagt…

... jovem:
... gostei da metáfora da vida!

... aparece!


xi-coração

Concha Pelayo/ AICA (de la Asociación Internacional de Críticos de Arte) hat gesagt…

Buenas Pascuas. Saludos.